“Ainda Estou Aqui” levou para o Brasil o primeiro Óscar de sempre, depois de ter vencido a categoria de Melhor Filme Internacional, na cerimónia mais famosa do cinema, a 2 de março, em Los Angeles. O filme realizado por Walter Salles tem sido um sucesso de bilheteira em todo o mundo. Só num mês em Portugal, por exemplo, arrecadou cerca de 1,1 milhões de euros. No entanto, a fortuna do realizador de 68 anos não tem nada a ver com esta indústria.
Salles possui um património avaliado em mais de quatro mil milhões de euros, segundo a revista “Forbes”. Isso significa que é o terceiro realizador mais rico do mundo — atrás de Steven Spielberg e George Lucas. A fortuna coloca-o também como o 11.º homem mais rico do Brasil, ao lado dos irmãos João, realizador de documentários e fundador da revista “Piauí”, Fernando e Pedro . Mas, afinal de onde é que vem tanto dinheiro?
Para perceber a origem da fortuna dos Salles temos de recuar até ao início do século XX, quando João Moreira Salles, avô do realizador e comerciante de café, fundou a Casa Moreira Salles, que agora conhecemos como Unibanco. O pai, Walter Moreira Salles, seguiu a carreira e tornou-se também num importante banqueiro e embaixador brasileiro nos Estados Unidos, durante a liderança de quatro presidentes, Getúlio Vargas, Juscelino Kubitschek, Jânio Quadros e João Goulart.
Walter sénior, além de estar inserido na elite política e financeira do Brasil e dos EUA, conhecia por dentro a realidade financeira. No final da Segunda Guerra Mundial, numa altura em que vários países atravessavam dificuldades económicas, o banqueiro viu uma oportunidade para aumentar a fortuna. Na altura, aproveitou o facto de a libra do Egipto estar mais barata do que os reais do Brasil e comprou, com o dinheiro que herdou da exportação de café, dinheiro egípcio, que depois levou a Zurique para trocar pela moeda brasileira. Lucrou e aproveitou para investir de novo, com a compra da Brazilian Warrant, o maior ativo inglês no Brasil, e adquiriu a Cambuhy, uma atual produtora de laranjas e cana-de-açúcar.
Aproveitar as melhores oportunidades
Com olho para o negócio, o político, que morreu em 2001, acabou por investir na indústria mineira de Minas Gerais, num mercado que ainda era pouco comum nos anos 1960: nióbio. Segundo a CNN Brasil, o metal, altamente valorizado para a indústria da tecnologia, revelou-se numa aposta certeira para a saúde financeira da família. Atualmente, a empresa dos Salles domina cerca de 75 por cento do mercado mundial deste metal. A empresa tem sede no Brasil e escritórios nos EUA, Europa e Singapura, e vende o metal para mais de 40 países, segundo a “Invest News”.
Mais recentemente, em 2017, a família fugiu um pouco dos mercados financeiro, agrícola e dos minerais, para investir na Alpargatas que detém uma das marcas mais conhecidas no mundo, a Havaianas. A marca, presente em cerca de 130 países em todo o mundo, teve um lucro em 2024 de 17,7 milhões de euros.
Em 2024, a Alpargatas vendeu 226,6 milhões de pares de Havaianas, segundo a “Fashion Network”, que resultou num aumento de 9,5 por cento em relação a 2023. Do total, 204,4 milhões de pares foram vendidos no Brasil, enquanto 22,2 milhões foram comprados no resto do mundo.
Atualmente apenas dois descendentes dos Salles continuam envolvidos nos negócios da família, Fernando e Pedro. O primeiro é presidente do conselho da Companhia Brasileira de Metalurgia e Mineração (CBMM) e o segundo é o presidente do Conselho de Administração do Itaú Unibanco, o maior banco privado da América Latina.
A herança familiar fez com que Walter Salles (júnior) tivesse acesso a recursos financeiros significativos para investir no que mais gostava, sem as pressões comuns que outros cineastas têm. Foi graças a este fundo que o realizador formou com o irmão João, em 1987, a produtora Videofilmes, responsável precisamente por “Ainda Estou Aqui”.
Além do filme que venceu o Óscar, Walter já realizou outras obras especialmente elogiadas pela crítica, como a “Terra Estrangeira” (1995), “Central do Brasil” (1998), “Abril Despedaçado” (2001) e “Diários de Motocicleta” (2005).
A juntar à herança familiar e aos frutos do seu trabalho, o cineasta é casado com a herdeira da maior produtora e exportadora de papéis do Brasil, a artista plástica Maria Kablin.