Pedro Borges, 49 anos, nasceu no Barreiro e cresceu entre réguas e compassos. O pai, desenhador e mais tarde arquiteto, transmitiu-lhe o gosto pelo detalhe e pela construção. Mas foi o espírito empreendedor que acabou por definir o seu percurso profissional.
“Entrei no curso de Arquitetura em 1995 e, em 1996, o meu pai encostou-me à parede e disse-me que não me daria mais dinheiro”, conta à NiB. Perante o desafio de manter a faculdade e a vida que levava, Pedro começou a pensar numa forma de garantir a sua independência. “Percebi que tinha de fazer um ‘segundo turno’, ou seja, estudar e trabalhar ao mesmo tempo”.
Foi nessa altura que a possibilidade de abrir um negócio começou a ganhar forma — e a verdade é que não era uma ideia nova. A hipótese estava na sua cabeça desde os 16 anos, quando saía com os amigos para a famosa Merendeira da Costa da Caparica.
“Sempre fui muito dedicado aos estudos, mas gostava de sair com os amigos aos fins de semana e à noite. Costumávamos ir à Merendeira e adorava os pães com chouriço”.
O avô já era negociante e o pai também. Por isso, abrir o seu próprio negócio parecia quase natural. Assim, no verão de 1996, depois de um ano muito focado na faculdade, começou à procura do espaço certo. A busca começou com observações da noite barreirense para perceber qual a zona com maior movimento. Acabou por escolher a Rua Eusébio Leão.
“Percebi que aquela era uma zona de passagem entre a ida para o Barreiro, à noite, e a vinda do Barreiro, para casa. Achei que era o sítio perfeito”, explica. Como empreendedor que sempre foi, não quis arrendar e avançou para a compra, com o apoio do pai, que se tornou seu fiador. A 7 de setembro do mesmo ano, abriu as portas do Farnel. “Nessa altura, nem sabia tirar uma imperial. Ainda assim, estudava de dia, trabalhava no Farnel até às 3 horas, e ainda conseguia encontrar tempo para fazer as maquetes e estudar”.
O nome surgiu naturalmente, inspirado nos farnéis, levados em lençóis ou cestos pelas famílias humildes do norte do País. “Tínhamos o hábito de ir para o campo, para o meio dos animais, e fazer piqueniques. E daí o nome, que tem tudo a ver com lembranças do meu passado”. Quanto ao conceito, Pedro garante que está exatamente igual àquele com que inaugurou o espaço. “Servimos os mesmos produtos: pão com chouriço, caldo verde, lombinhos de porco e arroz doce. Só acrescentámos a pizza”.
Quando iniciou o negócio, Pedro também assumia a cozinha do espaço. “Aprendi a cozinhar e a confecionar tudo o que vendemos. A partir daí, comecei a ensinar as receitas a todos os colaboradores que trabalham comigo”. Ao longo dos anos, foi aperfeiçoando essas receitas. Algumas, como a dos lombinhos, vieram da experiência do pai e de um tio, pasteleiro durante muitos anos.
Sobre o Barreiro que viu nascer o Farnel, Pedro descreve uma cidade diferente — mais crua, sem tecnologias, mas com mais movimento noturno. “Era um Barreiro mais primitivo no que diz respeito à noite, mais áspero e com muita gente. Os tempos eram outros”. A realidade é que os barreirenses aceitaram muito bem o novo espaço na cidade, tanto que Pedro “não tinha mãos a medir perante tanto trabalho”.
Nessa altura, só tinha metade da loja atual, que tem agora cerca de 140 metros quadrados e 50 lugares sentados. Com o tempo e a adaptação às novas exigências legais, foi crescendo. Mais casas de banho, cozinha maior, espaço organizado. Os fornecedores são, até hoje, os mesmos e o espírito também. Pedro acredita que o segredo está na simplicidade e no foco na experiência humana. “Há quem vá ao Farnel não tanto pela comida, mas pela energia e pela forma como são recebidos”.
Com 29 anos de história, o Farnel tornou-se um espaço emblemático no Barreiro. “Há pessoas que começaram a namorar ali. Muitos dos clientes já o frequentam há décadas. Alguns chegaram a ir ainda em miúdos e agora levam os filhos. É um sítio que marcou várias gerações”.
Carregue na galeria e veja algumas imagens do Farnel.